sexta-feira, 29 de novembro de 2013

O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias


Muitos filmes têm tratado da temática da Ditadura Militar, mas o que me chamou atenção especialmente em “O Ano em que meus Pais Saíram de Férias” foi abordar esse tema pelos olhos de uma criança. Mauro(Michel Joelsas) é obrigado a ficar de férias com o avó enquanto os pais estão em exílio por serem militantes de esquerda.


Cao Hamburger dirige este filme semi-autobiografico investindo em algo que não é muito comum em filmes que contêm essa abordagem: A Ternura o que acaba por se tornar o principal diferencial do longa. Cao tem experiência em lidar com esse público(foi diretor do “Castelo Rá-Tim-Bum” entre outros programas destinados a este publico. Isso explica a destreza com que constrói e comanda as relações entre o Menino Mauro(Michel Joelsas) com o seu interior e os outros personagens.

Estruturando a tensão dramática de forma sutil Cao investe na direção de atores de maneira afável. A tensão dramática aqui representada pelos acontecimentos que são alheios ao protagonista Mauro(Michel Joelsas) permite que Hamburger coloque o personagem em uma situação de deslocamento. Cao capta de forma hábil as reações e os sentimentos internos do personagem principal, apostando em closes e na captura de feições puramente genuínas próprias a uma criança.

Hamburger tem preocupação em captar o universo interno do protagonista abrindo espaço para o lúdico próprio do imaginário infantil. A forma particular com que trata os anseios daquele menino envolto em uma bolha de reclusão(elemento esse ressaltado de maneira sutil pela tensão dramática) é brilhante pois a interação entre Mauro(Michel Joelsas) e os outros personagens é feita de forma gradativa abrindo espaço para a reclusão e o inevitável choque de culturas oriundo da sua relação com o judeu ortodoxo Shlomo(Germano Haiut).

Cao tem extrema habilidade de explorar cada plano ao Maximo que pode. Toda e qualquer incursão feito dentro do universo fílmico tem razão de estar ali. O roteiro é bem sucinto nesse sentido e favorece o trabalho do diretor no momento de orquestrar a narrativa. Da mesma forma, todos os personagens tem razão de estar ali tendo suas funções dramáticas bem definidas e tendo seus adendos á narrativa construídas e desabrochadas no momento certo pelo diretor. Um truque de Mestre.


Hanna(Daniela Piepszyk) a outra protagonista estimula o lúdico do personagem principal sendo a responsável por “furar” a bolha de exclusão em que o personagem se acomoda.


Apesar de “O Ano” ser um filme que aborda a Ditadura Militar, aqui ela está inserida em segundo plano e de forma sutil. O foco mesmo é a infância do protagonista Mauro(Michel Joelsas) o que da margem a uma abordagem diferenciada tratando inclusive de aspectos culturais do Brasil naquela época. A Ditadura aqui está escondida nas entrelinhas e refletida na iminência da angustiante espera do Menino por seus pais.


Michel e Daniela interpretam os protagonistas Mauro e Hanna de forma genuína com graça,talento e principalmente naturalidade.

Germano Haiut reflete em sua atuação justamente o que seu personagem Shlomo representa para o filme: Um personagem de opostos que se deixa encantar por aquele menino de maneira gradativa e sincera.




“O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias” é um filme terno sobre um tema pesado. Se é que é possível que isto aconteça em um filme. Mas o fato é que Cao Hamburger conseguiu construir um filme com um olhar diferente sobre um tema já tratado anteriormente (embora não tantas vezes quanto deveria). É esse o diferencial de “O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias” um outro olhar mais terno sobre um tema pesado, propondo reflexão. 

  

  




terça-feira, 26 de novembro de 2013

Edifício Master



    Os documentários de Eduardo Coutinho se originam de experiências fílmicas propostas pelo diretor e do registro delas. Em “Edifício Master” Coutinho se propõe a registrar o cotidiano de um famoso edifício em Copacabana e as memórias de seus moradores.


Apostando na força de seus “atores sociais” Coutinho estabelece uma dinâmica de maneira que seu documentário toma forma através dos depoimentos dos moradores. É através dos depoimentos que o espectador toma conhecimento da importância histórica ,social e cultural daquele prédio bem como as histórias folclóricas que a cercam reforçando seu misticismo.

Há uma curiosidade do documentarista pelas trajetórias de vida daqueles personagens, construindo um histórico de vida sobre como foram morar naquele lugar repleto de lendas. Deixando seu entrevistado em posição confortável Eduardo Coutinho estabelece um ambiente de liberdade proporcionando que os depoimentos sejam extremamente sinceros e cru em alguns momentos. O papel social de Coutinho dentro do documentário (além é claro de ele ser o diretor) é a de um buscador e contador de histórias. É impressionante a maneira com que ele busca e instiga o entrevistado a revistar o passado e compartilhar suas histórias com naturalidade e de maneira sutil. Isso contribui para o despudor que os personagens tem de revelar passagens tristes da sua vida.

Os personagens estabelecem uma relação de cumplicidade com a câmera(resultado do terreno confortável a que Coutinho expõe seus entrevistados). Essa relação cúmplice permite ao espectador conhecer mais sobre aquelas pessoas aquele lugar e a transformação destes.

A forma instigante que o documentário tem exerce uma curiosidade absurda no espectador. Seja pela forma da direção de Coutinho que é muito limpa(ao contrário de “Um Lugar ao Sol” de Gabriel Mascaro que bebe em fonte semelhante mas com proposta extremamente diferente). O filme por si só instiga a acompanhar aquelas pessoas e suas histórias de maneira parecida a proposta dos Realitys Shows. “Edifício Master” pode ser encarado dessa forma pelo formato que possui de acompanhar e retratar vidas alheias ou pelo retratado da degradação daquele conjugado de apartamentos e seus moradores ou até mesmo pelo passado “marginal” do lugar. Mas “Edifício Master” é muito mais que um Reality Show, histórias de seus moradores e etc. É um estudo sociológico da evolução não só daquele lugar mas da cidade do Rio de Janeiro como um todo. 

“Edifício Master” tem um aspecto particularmente interessante que é a revelação do aparato cinematográfico. Coutinho juntamente com sua equipe nos revela toda a sua preparação incluindo os instrumentos necessários para realização do filme. Aqui o “por trás das câmeras” é revelado se tornando um elemento extremamente rico que engrandece o documentário.

O documentário atinge diversos campos de compreensão. Ao mesmo tempo que é um filme sobre o retrato de si mesmo e suas histórias, possui um aspecto de resgate histórico. É também, um filme sobre o outro. Sobre a visão que aquele morador tem de seu vizinho e do passado daquele local.


“Edifício Master” é uma experiência múltipla. Um filme que propõe um resgate não só social e histórico mas de si mesmo, do seu interior. É a possibilidade de recordar suas memórias. Concluindo, “Edifício Master”   não é só um documentário é uma experiência de revelação do aparato cinematográfico.


    

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Eu Não Quero Voltar Sozinho


A adolescência é uma fase de descobertas e se você por ventura têm algum tipo de limitação essa fase se torna ainda mais complicada mas, ao mesmo tempo esse “terreno novo”proporciona um imenso paraíso de possibilidades.


As diferenças e as descobertas nessa fase da vida é o tema principal de “Eu Não Quero Voltar Sozinho” Curta Metragem de Daniel Ribeiro.

“Eu Não Quero Voltar” conta a história de Leonardo vulgo Léo(Guilherme Lobo) um adolescente cego que encara as dificuldades da vida com muita perseverança e otimismo. Léo têm em Giovanna(Tess Amorim) sua melhor e única amiga. Tudo muda com a chegada de Gabriel(Fábio Audi) um aluno novo que muda sua forma de ver o mundo.


O diretor Daniel Ribeiro possui um talento especial de abordar temáticas polêmicas com sensibilidade e destreza como no seu Curta anterior “Café Com Leite” sensibilidade essa que atinge níveis emocionantes e inspiradores.

Desenvolvendo a dinâmica entre os três protagonistas de forma gradual e suave Ribeiro centraliza sua história através do ponto de vista de Léo(Guilherme Lobo) e sua relação com os outros personagens. A dinâmica estabelecida entre eles –Léo , Gabriel e Giovanna constrói uma relação fraternal de amizade verdadeira entre os protagonistas ao mesmo tempo em que são personagens absolutamente humanos e criveis possuindo sentimentos como o ciúme e o amor por exemplo.

Construindo uma narrativa pura e simples Ribeiro aborda temas importantes nas entrelinhas como a descoberta da sexualidade , o ser diferente e a superação.
A abordagem da deficiência visual de Léo(Guilherme Lobo) é feita de forma absolutamente verdadeira,natural e com otimismo. Por exemplo, quando Gabriel(Fábio Audi) pergunta a Léo se ele sempre foi assim se referindo a sua deficiência visual e ele responde : “Assim como? Moreno ou cego?”. Esta frase sintetiza de certa forma a noção de igualdade social e do respeito as diferenças que o longa aborda. Importante salientar a forma brilhante que esses temas são abordados tanto a descoberta da homossexualidade quanto a deficiência de Léo(Guilherme Lobo). Esses temas surgem ou melhor brotam no Curta de maneira natural gradativamente – um excelente trabalho de construção de narrativa feito pelo diretor e roteirista Daniel Ribeiro.

Quanto a abordagem da deficiência visual de Léo(Guilherme Lobo) ela é feita de uma maneira muito crível,sem maniqueísmos e nenhuma abordagem panfletista pelo contrário a mensagem é passada através das entrelinhas de uma forma muito sensível e a trajetória de superação do personagem frente a suas limitações e descobertas é feita de forma natural e poética.

Pautando o filme em uma narrativa sensorial o filme abre espaço para inúmeras interpretações e simbolismos frente á delicadeza e naturalidade que os temas brotam na tela. No fim, é como se o diretor estivesse “convidando” o espectador a se auto descobrir junto com os personagens.

A trilha sonora reforça o aspecto emocional de descobertas por quais passa o personagem Léo(Guilherme Lobo) pela sua sexualidade e pelos novos sentimentos que surgem. Dando o tom das cenas, reforçando o aspecto poético ,lírico , romântico e fraternal que envolta a trama. As Canções “Beijo Roubado em Segredo” de Tatá Aeroplano e Juliano Polimeno e “Janta” de Marcelo Camelo e Malu Magalhães tem funções narrativas importantes na história servindo como pano de fundo para a trama e com funções narrativas exercidas em momentos do filme. Enquanto “Beijo Roubado em Segredo” sintetiza o filme sendo sua musica tema, “Janta” funciona como pano de fundo para um ponto de virada primordial no filme.

O trio de atores principais Guilherme Lobo(Léo),Fábio Audi(Gabriel) e Tess Amorim(Giovana) esbanja sintonia e entrosamento cênico  (ótima direção de atores de Daniel Ribeiro). O trio aposta muito em uma atuação refletida nos olhares e gestos do que propriamente na força do diálogo. A beleza aqui está no sub texto.


Me faltam palavras para descrever “Eu Não Quero Voltar Sozinho” mas eu vou tentar. É um Curta Metragem singelo, com uma história bonita repleta de simbolismos e significados. Não estou falando na beleza visual apesar de que neste quesito o filme não deixa nada a desejar mas da beleza da mensagem , da vida. Resumindo: É um filme que emociona , te faz refletir, te cativa e te deixa em êxtase puríssimo com sua forma bela e delicada de abordagem. E não para por ai, o curta será transformado em um longa intitulado “Hoje eu Quero Voltar Sozinho”. Aguardaremos com ansiedade.

  
   
 Assista o Curta no Vídeo Abaixo:




         




domingo, 17 de novembro de 2013

Jogos Vorazes: Em Chamas



Katniss(Jennifer Lawrence) e Peeta(Josh Hutcherson) se sagraram vencedores da edição anterior dos “Jogos Vorazes” em um feito inédito. Tal feito lhes garantiu tamanha popularidade pois irão embarcar na “turnê da vitória” mas desagradou as autoridades em especial o Presidente Snow(Donald Sutherland) que anuncia que os vencedores das edições anteriores dos “Jogos Vorazes” voltarão ao campo de batalha dessa vez no “Massacre Quartenário” uma edição especial dos jogos.

Um aspecto interessante em “Jogos Vorazes” é o fato de conseguir dosar entretenimento e reflexão crítica na tela grande(ainda não li os livros que originaram a série). Esses dois elementos tão carentes ao público jovem estão presentes de forma mais coesa nessa continuação “Em Chamas”.

O diretor Francis Lawrence (que substuiu o Gary Ross o diretor do filme anterior) concentrou seu trabalho em duas linhas paralelas que se complementam na tela grande. Por um lado Lawrence estruturou o universo fantástico em que a trama está inserida adotando uma narrativa ágil com sucessões rápidas de planos, elipses e corte seco.Lawrence ainda investiu em um trabalho de direção mais corporal digamos assim, apostando na dinâmica entre o elenco o que permitiu que utilizasse closes e planos próximos de maneira que os atores atuassem com naturalidade. O diretor induziu uma dinâmica que imprimiu agilidade nas cenas de ação mantendo a tensão dramática eminente. Lawrence realçou os três universos opostos que coexistem no filme: A pobreza e a luta pela sobrevivência representada por Panem, os jogos e a realeza representada pela capital e o universo televisionada do reality show com todo o glamour e a mise-en-scene proveniente da ocasião.

O diretor realizou uma direção com base no impacto tanto de ação dramática quanto visual e sonoro,além de corrigir as falhas do primeiro filme tornando mais coeso e palpável ao público. Só acho que ele poderia ter aproveitado melhor os planos , trabalhado-os mais. Nesse aspecto a agilidade da montagem pecou um pouco mas nada que prejudicasse a estrutura do filme.

Quanto a fotografia e o aspecto visual do longa podemos afirmar que ela funciona através de contrastes- aliás como todo o enredo. Na capital se usa cores vivas e vibrantes e abundancia remetendo aquele cenário ao um aspecto caricato. Já em Panem e durante os jogos utilizam-se cores frias como o azul e verde além de uma iluminação mais dura.

O som tem papel importantíssimo em “Em Chamas”. É ele que endossa a tensão dramática,reforçando a tensão iminente e anuncia a chegada do clímax da ação. O Som é impactante agregando tanto as cenas de ação quanto aquelas de suspense aumentando a sensação de tensão dramática no espectador. O som aqui inaudível reproduz o impacto narrativo de tamanha grandeza tal como o do filme.

O Roteiro escrito a 6 mãos pela autora dos livros Suzanne Collins , Simon Beaufoy e Michael Arndt é muito mais palpável ao espectador sem entretanto soar telegrafado.  O Grupo constrói o universo narrativo de forma exata transpondo o telespectador para dentro daquele universo.
 Um fator interessante no que diz respeito a construção dos personagens de “Em Chamas” é que são personagens ambíguos. Todos tem “dois lados” e transitam nessa linha tênue com destreza. Sobretudo, são personagens mais humanos com qualidades e defeitos.  Enquanto Katniss(Jennifer Lawrence) e Peeta(Josh Hutcherson) aprendem a controlar suas emoções e se tornarem seres selvagens realçando a emoção em momentos de segurança. Personagens antes controlados pela frieza emocional como Elfie(Elizabeth Banks) e Haymitch(Woody Harrelson) demonstram suas emoções. Haymitch, um personagem totalmente ambivalente tem suas emoções afloradas pouco a pouco enquanto Elfie(Elizabeth Banks) é uma personagem deliciosamente caricatural.

O elenco encabeçado por Jennifer Lawrence(Katniss) e Josh Hutcherson(Peeta) estão todos encaixados em seus devidos papeis e confortáveis em suas funções narrativas atuando com naturalidade.

Admito que demorei a aceitar Lawrence como a heroína Katniss mas bastou algumas cenas para a atriz se revelar a escolha certa pra esse papel pois foge do esteriotipo de heroína clássica. Katniss é uma personagem fora do padrão e Lawrence personifica a personagem de forma perfeita.
 Josh Hutcherson traz um Peeta mais humano nessa sequência. Mais aberto aos sentimentos não tanto racional como no primeiro filme. Lenny Kravitz ressurge irreconhecível como Cinna, o estilista de Katniss e Peeta. Tão irreconhecível que só fui sacar que era ele o ator ao ler a ficha técnica. Lenny compõe um personagem alegórico, fiel e com humor refinado carregando nas “tintas dramáticas” sem torná-lo over. O mesmo não pode-se de dizer de Elizabeth Banks. A atriz faz de Elfie uma personagem over sim mas de forma positiva. Elfie é deliciosamente carictural, over e estridente. Banks carregou na interpretaçao com gosto o que torna mais adorável a forma estridente que a personagem expõe suas emoções.


  Woody Harrelson também traz um Haymitch diferente nesse segundo filme.  Ainda ambivalente de natureza, o personagem está mais seguro e um pouco mais estável capaz de orientar Katniss e Peeta. Harrelson dosa os “ups” e “downs”do personagem garantindo um merecido destaque no longa.  A  grande surpresa no elenco atende pelo nome de Philip Seymour Hoffman. O ator interpreta  Plutarch Heavensbee um ex vencedor dos jogos ressaltando a ambiguidade do personagem envolto em uma áurea de mistério e falsidade aparente. Philip Seymour Hoffman entrega uma interpretação magistral do personagem se destacando pela magnitude que empresta ao personagem.


“Jogos Vorazes: Em Chamas” é realmente um filme de imensa magnitude e grandeza que ganha força por contrabalançar um entretenimento de qualidade contando com um universo estético e narrativo verossímil com reflexão crítica propondo aos jovens público-alvo do filme refletir e questionar. Ainda com o seu final de extremo impacto que deixou com vontade de mais.


  

   

    

  

   

    

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Amarelo Manga



Ligia(Leona Cavalli), Kika(Dira Paes),  Wellinton(Chico Diaz), Dunga(Matheus Nachtergaele) e Issac(Jonas Bloch) tem suas vidas cruzadas tendo como pano de fundo um pequeno hotel no Recife.


Conheço muito pouco do trabalho do Cineasta Cláudio Assis conhecido pelos personagens marginais e pela estética repleta de hiper violência visual elementos presentes nesse ótimo “Amarelo Manga”.

Calçado na força visual para retratar(ou justificar a escória pessoal dos personagens).Assis situa o espectador naquelas situações que envolvem seus personagens marginais através de planos gerais oferecendo assim ao espectador uma visão privilegiada “Vista de Cima” da ação. Além de situar o espectador na vida daqueles personagens abjetos o diretor situa-nos naquele ambiente execrável certo de que o ambiente em que vivem tem sua “Parcela de Culpa” na personalidade daqueles personagens. Pra evidenciar o ambiente como um espelho dos personagens o diretor investe em planos descritivos e na interação ator-texto(os personagens de Chico Diaz e Dira Paes são bons exemplos disso).  Os planos descritivos representados principalmente pelos Travellings executados com perfeição que captam a sujeira visual daquelas  ruelas- aspecto ressaltado por uma fotografia igualmente suja.

Aliás , a natureza crua da fotografia realça os planos descritivos que servem como apresentação dos personagens em cenas comandadas com destreza pelo diretor Cláudio Assis que impressionam pelo realismo visual e dramático. Um excelente exemplo do elo de ligação entre a fotografia e a direção.

As cenas ganham uma certa poesia pelas mãos do diretor. Mesmo abusando da ultra violência(aqui mais visual do que propriamente física) e da sexualidade exacerbada que estão encaixadas dentro do contexto do filme. Assis converte esses elementos a favor da dramaturgia e do impacto visual de seu Longa.


Dois outros elementos também inteiramente ligados em “Amarelo Manga” são o Roteiro e a Montagem. O roteiro de Hilton Lacerda possuiu um aspecto semelhante a um recorte de modo que apresenta aqueles personagens tão dispares de modo a introduzir seus plots e deixa-lós em “Banho Maria” só pra poder emergir os personagens do “limbo dramático” no momento certo. Lacerda ainda construiu personagens marginais de transição,mutação. Estando sempre passiveis a mudar como realmente se transformam. A Montagem de Paulo sacramento sabe organizar esses plots de forma orgânica e compreensível ao espectador assim como “prepara o terreno” para os pontos de virada do filme.


O elenco realmente atua de forma visceral ,estando todos em uma espécie de incorporação de seus respectivos papéis tamanha a naturalidade com que interpretam estes tipos ambíguos. Todo o elenco está perfeito mas três nomes chamaram a minha atenção particularmente: Jonas Bloch como o necrófilo Issac pelo modo impar que conduz a patologia de seu personagem. Chico Diaz como o açougueiro Wellinton pela frieza e deste modo a profissão do personagem é um reflexo de sua personalidade que me remeteu muito ao açogueiro dos filmes “Carne” e “Sozinho contra Todos” do cineasta argentino Gaspar Noé.



“Amarelo Manga” é um filme extremamente repulsivo e ao mesmo tempo hipnotizador sendo que o espectador é intimado a assistir aquele universo execrável até o fim e assim acabando por gerar compaixão no espectador por aqueles personagens. Com este filme maldito me rendo á Cláudio Assis. 



segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Enter the Void


Oscar(Nathaniel Brown) vive em Tóquio com sua irmã Linda(Paz de La Huerta). Oscar é um traficante de pequeno porte e Linda é Stripper no clube local, mas um acontecimento põe suas vidas em perspectiva.


Quando eu achava que o cineasta Gaspar Noé não poderia mais me surpreender assisto esse “Enter the Void” que não é simplesmente um filme mas sim uma experiência lisérgica e onírica.


Elevando seu estilo a outro nível fílmico “Enter The Void” é uma obra com inúmeras possibilidades de interpretação. Metalinguística e com forte apelo visual que aqui atingem o seu ápice da carreira de Gaspar Noé.

A metalinguagem aqui exposta na forma do personagem em seu auto-filmar com uma câmera na mão proporciona uma imagem tremida , orgânica a ação onírica e surrealista que o filme proporciona aos seus espectadores uma viagem atmosférica de sonho e lisérgica.  As sobreposições de cenas favorecem a percepção de outro estado de consciência seja pelo uso de drogas ou pelo emocional dos personagens. O fato da câmera de Noé estar sempre em movimento e desbravando os ambientes adentrando-os e também pelo uso de planos gerais que proporcionam uma visão panorâmica da ação vista de cima. Essa tal “visão panorâmica” permite que o diretor adentre outras realidades e espaços fílmicos que se fundem a ação dramática funcionando como objeto de transição de planos muito semelhante ao recurso utilizado no longa “Estrada Perdida” de David Lynch.

Gaspar Noé adentra outros universos fílmicos através de closes promovendo a fusão entre esses dois universos para a criação de um terceiro.  Assim, ele convida o telespectador embarcar nessa viagem com múltiplos significados tendo como pano de fundo a sexualidade tema próprio do seu estilo.  Através de um trabalho minicioso de montagem e roteiro Gaspar Noé converte seu filme em uma sucessão de aparentes flashbacks que se fundem com o tempo corrente do filme. aparente porque se tratando de um filme como esse o espectador perde a noção do que é real e do que é irreal e ai está a grande graça do filme é o espectador construir uma linha de raciocínio através daquelas imagens para o diretor desconstruí-las e fazer seu pensamento virar pó.




Noé investe mais fortemente no poder visual do filme do que nos diálogos . as cenas tem por si só uma grande carga dramática embutida. Noé sabe a força que as cenas tem por isso investe no universo onírico do sonho de uma realidade paralela durante grande parte do filme. O elemento onírico do filme está estritamente ligado ao visual ou seja, a iluminação que aposta em cores quentes e vivas além de expor um fotograma intenso e “a meia luz” como uma lâmpada prestes a se romper. As imagens e o aspecto visual ocupam grande espaço fílmico pois o diretor Gaspar Noé acredita que nem tudo precisa ser explicado e nem tudo tem uma explicação aparente. As imagens colocam o espectador em estado de inércia, vidrado no poder da imagem e deixa o espectador sem a capacidade de esboçar reação. Quaisquer que seja ela.



Gaspar Noé extrapola todos os seus limites, subverte símbolos e formulas além dos próprios elementos do cinema. Tudo isso para deixar o seguinte recado: ” Nem tudo na vida tem a necessidade de ser explicado,as vezes as coisas ultrapassam a explicação. Não importa o que você ouve mas o que você sente. 








quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Irreversível



Minhas experiências com a filmografia do cineasta Gaspar Noé tem sido no mínimo impactantes. Após o chocante media-metragem “Carne” e sua continuação igualmente perturbadora  “Sozinho Contra Todos” sou brindado com outra experiência transformadora com este “Irreversível”.

“Irreversível” é a saga de busca por vingança dos amigos Marcus (Vincent Cassel) e Pierre(Albert Dupontel) pelo estupro de Alex(Monica Bellucci) Namorada de Marcus e ex de Pierre.


Com hiper- violência e realismo visual gritante o filme impressiona primeiramente pelo modo que Gaspar Noé conduz os movimentos de câmera em sentido rotatório. Sua Câmera nunca está estática mas sempre em movimentos em sentido rotário causando impressões de frenesi ao espectador. A câmera é capaz de se mover de modo extremamente ágil evidenciando diferentes pontos da ação dramática Ora a câmera te da a perspectiva de cima com excelentes planos gerais comandados com destreza por Noé, em outros momentos a câmera gira em sentido horário e anti-horário.

Outro aspecto interessante do longa é fato dele ser quase que inteiramente em plano sequencia revela a maneira ousada que o diretor utiliza para realizar as transições entre os planos é genial. Noé adentra em sentido rotatório com sua câmera e sem pedir licença o outro espaço fílmico.

O impacto visual das imagens é extremamente forte. Seja pelas cenas de extrema violência estilística  e escatologia seja pelas cores quentes que a realçam reforçando seu impacto e o magnetismo que causa no espectador sendo impedido de parar a projeção antes do fim, quaisquer que seja o sentimento e reação que o filme esteja te causando. Seja de repulsa ou excitação(como foi o meu caso).

A Verdade é que Noé não economiza no realismo e no grafismo visual das cenas. Apostando no realismo cru das imagens permeados por cores quentes e vivas e por uma iluminação potente o diretor investe na exposição realística e ultra violenta com o realismo e a sujeira latentes.


O som tem grande importância no impacto visual de maneira que engrandece as cenas reforçando o seu impacto com um som audível e latente. Resultado –creio eu- de um excelente trabalho de pós produção que tornou o som um elemento que serve pra impactar uma ação dramática(como no caso dos closes) ou para servir de pano de fundo como nas cenas de transição e ação dramática por exemplo. Os timbres latentes utilizados aproximam o filme a estética do videoclipe pelos efeitos clipados e a agilidade cênica que as cenas que combinadas o seu aspecto mais tremido com a iluminação de uma fotografia excepcional diga-se de passagem constrói um universo estético representativo e condizente com o estilo de Noé.


O trio protagonista Vincent Cassel(Marcus) , Albert Dupontel(Pierre) e Monica Bellucci(Alex) demonstram empatia , entrosamento e química cênica. Estando todos confortáveis com suas posições dramáticas na narrativa do filme e atuando de forma natural.  Cassel arrebenta mais uma vez ao dar o tom certo de ironia e masculinidade a Marcus é realmente um tipo bem masculino reforçado pelo biótipo e inteprertaçao de Cassel perfeito como primeiro vértice desse “triangulo amoroso” Dupontel por outro lado aposta em uma interpretação mais simplista e comedida sendo responsável pela “voz da razão”, a consciência do filme. Monica Bellucci exala sensualidade pelos poros como Alex. Se por um lado a personagem gosta do jeito mais masculino e decidido de Marcus(Vincent Cassel) por outro precisa do jeito mais carinhoso e afável de Pierre(Albert Dupontel). Um “Dona Flor e Seus Dois Maridos” a lá France. Vale ressaltar a capacidade de interpretação que Bellucci imprimiu na cena do estupro magnânima.


Gaspar Noé apresenta mais um filme que supera o excelente. É hipnotizador, impactante e transformador entre inúmeros outros adjetivos.  Noé continua a destilar seu estilo verborrágico, extremamente violento e pecaminoso sem fazer concessões. Assim é Gaspar Noé. Ama ou odeie é impossível ser indiferente ao seu Cinema.