segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Eu não faço a menor ideia do que eu to fazendo com a minha vida




Quando Matheus Souza lançou seu primeiro filme o universitário “Apenas oFim” em 2008 , ele foi aclamado pela maneira realista que retratou a geração atual, recheado de diálogos com referencias pop e pela quebra de estereótipo. No ano passado, o diretor lançou “Eu não faço a menor ideia do que eu to fazendo com a minha vida” no qual munido de todos os artifícios que fizeram sucesso em seu primeiro longa mas com outra abordagem e mais experiência ele direciona seu trabalho pra uma outra vertente dos questionamentos da juventude.


“Eu não faço a menor ideia do que eu to fazendo com a minha vida” poderia ser resumido com a clássica pergunta “O que eu vou ser quando crescer?” mas se você já está crescido? Esse é o dilema de Clara(Clarice Falcão) que é estudante de medicina por pura influencia familiar mas tem duvidas quanto a sua real vocação.

Com uma história simples e como diz um dos personagens já batida mas universal desde que o mundo é mundo , Matheus Souza traz um filme inspirado em seu segundo longa. Com a agilidade que lhe é característica com o adendo de uma estética meio televisiva semelhando as esquetes, “Eu não faço a menor ideia do que eu to fazendo com a minha vida” demora alguns tempo para ganhar ritmo próprio mas quando o faz deslancha com naturalidade.

Essa naturalidade é proveniente da maneira delicada e repleta de Matheus Souza ao dirigir. A naturalidade com que conduz a narrativa, torna as trucagens habituais quase imperceptíveis tornando o tempo fílmico algo trivial e com um elemento surpresa pois ao utilizar sua agilidade característica dos seriados americanos Souza adiciona um ritmo muito veloz a estrutura do longa o que favorece o experimentalismo fílmico e os diálogos que aparecem posteriormente.

A maneira ágil e feroz que Matheus Souza dirige um filme com muitos cortes sobreposições, sequencias rápidas de planos , fortalece a trucagem dos planos , as gags , o experimentalismo fílmico que se sobrepõe ao longa e as interpretações naturalistas dos atores.

O experimentalismo citado acima faz parte da busca interior da protagonista , no qual Souza numa ótima sacada realiza uma metalinguagem momentânea e inspirada. O fato de a estrutura do longa ser semelhante a estética das sitcoms garante a Souza e aos atores um maior aproveitamento do espaço fílmico/ narrativo o que garante um naturalismo das cenas que fluem natural e suavemente e não é aquela situação forçada na qual o espectador se sente obrigado a rir.


A maior capacidade do diretor e também o maior triunfo do longa é o seu roteiro inspirado, com diálogos muito bem construídos com citações e uma enorme veia pop característica do diretor. Diálogos como “perde a capacidade de ser um gênio incompreendido” , “uma stripper revoltada contra o sistema” e o melhor de todos “ a única pessoa que fez escolhas piores na vida é o Nicolas Cage”.

Matheus Souza também aprimora a sua capacidade cênica de dirigir. A forma subliminar que conduz as cenas resulta em atuações espontâneas e cômicas por natureza. Primeiro por parte dos protagonistas Clarice Falcão(Clara) e Rodrigo
Pandolfo(Guilherme) o seu guia no experimentalismo /Bff/Interesse amoroso, segundo pelos coadjuvantes Bianca Byington e Leandro Hassum , além é claro de Gregório Duvivier o Johnny Depp do diretor. Uma pena que sua participação é tão curta pois Gregório está hilário.


“Eu não faço a menor ideia do que eu to fazendo com a minha vida” é um bom filme. Um bom não, um ótimo filme. Redondo, com uma direção delicada, atores excelentes e roteiro inspirado com uma verve cômica natural. Falta ao filme uma maior duração. Sério, o filme é tão bom mas é muito curto, não me importaria de assistir no mínimo meia hora a mais de filme. O outro porém é a falta de diálogos nerds que marcaram o diretor. Fora isso, “Eu não faço a menor ideia do que eu tô fazendo com a minha vida” beira a perfeição.




domingo, 16 de fevereiro de 2014

Ela


No mundo cibernético de hoje, todos estamos plugados o tempo todo e necessitamos que seja assim quase que 24 horas por dia. Twittamos, fazemos amigos e conversamos pelo facebook, escrevemos textos no Word e blogamos( o texto que você vai ler em um Blog foi escrito no Word). A tecnologia nos permitiu a abertura de um novo mundo por outro lado ocasiona uma certa dependência e solidão.


Este é o tema central de “Ela” do diretor Spike Jonze. Ele nos apresenta um escritor em crise(quem nunca sofreu com a síndrome da página em branco? Eu mesmo estou saindo de um bloqueio criativo ao escrever isto pra vocês.) “Ela” nos apresenta a figura de Theodore(Joaquin Phoenix) , um escritor em crise que perdeu o tesão pela sua escrita e ainda amargura e protela a separação de sua mulher. Theodore vive isolado em seu mundo cibernético até que compra um novo sistema operacional ultramoderno que muda sua percepção da vida e ainda por cima tem a voz da Scarlett Johansson!


Eu não conheço o trabalho de  Spike Jonze a fundo mas a forma como ele construiu esse filme me deixou muito curioso e admirado pelo seu trabalho. Primeiramente , Jonze demonstrou uma habilidade de concepção fílmica esplendida, construindo um universo fílmico á parte, quase uma utopia tecnológica ou em um episódio de “Os Jetsons”. Na construção desse universo fílmico particular, o diretor deixa subtendido em linhas claramente perceptíveis mas de forma muito natural a solidão interna que assola o protagonista Theodore(Phoenix). Dessa forma, o Cineasta pauta a sua direção na sensibilidade , induzindo um ritmo particular ao longa com uma atmosfera muito sutil e intima.

Jonze realiza uma excelente direção de atores(ou diria ATOR), nesse caso Joaquin Phoenix. Conduzindo sua direção com naturalidade e sutileza o Cineasta explora a interpretação mais primitiva do ator, apostando nos movimentos  e expressões mais básicos e triviais como closes e panorâmicas muito bem executados em uma excelente dinâmica ator-diretor. O filme em termos técnicos e narrativos se desenrola como um grande monologo.


O longa possui uma estética muito rica que remete a algo futurista. Essa roupagem é transdimensional , fortalecendo a perceptiva de futuro tecnológico que vivemos ao mesmo tempo, esse universo transdimensional representado no filme por alusões perfeitas do Xbox e do Second Life é combinado por um aspecto sensorial que é representado pelo psicológico de Theodore e por Samantha(Scarlett Johansson) que assume o papel de consciência do protagonista.


Não bastou Spike Jonze construir um filme perfeito técnica e esteticamente falando, ele ainda construiu um roteiro sensacional. Muitas vezes recorrendo a estrutura do monologo teatral, reforçando não só a construção do espaço/universo cênico mas principalmente o psicológico do protagonista(Phoenix).

O Fato de o roteirista ter conferido emoções a “voz” de maneira gradativa permitiu que Samantha tomasse forma cênica mesmo sem ter uma “forma”. Isso permitiu que  Scarlett Johansson se destacasse imensamente, a atriz merecia um premio por sua voz. É incrível a forma como Scarlett consegue soar sensual e transmitir emoção através da fala.


Joaquin Phoenix é de um talento extraordinário. O ator consegue expressar toda a melancolia do personagem somente usando feições e aspectos puramente cênicos sem usar a fala. Sua interpretação é intensa, forte mas muito sutil. O ator rouba a cena literalmente sobretudo pela forma exemplar que compõe o psicológico do personagem e a “química cênica” que têm com  Scarlett Johansson.


“Ela” é um grande filme. Uma aula em termos de conceito e realização cinematográfica. Uma maravilha fílmica que nos deixa anestesiados pela construção perspicaz da narrativa e a composição fílmica bem como uma notável direção cênica. “Ela” é um filme excelente. Sensível, reflexivo e moderno. Melhor ainda: Me tirou do meu bloqueio criativo semelhante ao de Theodore. Spike Jonze você ganhou uma fã, vou conferir seus outros trabalhos correndo.      



domingo, 9 de fevereiro de 2014

Um Dia na Vida


Um dos últimos documentários de Eduardo Coutinho é uma experiência ousada, provocadora e rara. Isto porque “Um Dia na Vida” trata-se do registro de Coutinho da programação da televisão brasileira.


Concebido como fonte de pesquisa para outro filme “Um Dia na Vida” tomou vida própria e foi quase que condenado ao anonimato devido a questões de direitos de imagens. Mas se você me pergunta o que há de tão provocador e ousado em uma simples registro aleatório da programação. E eu lhe digo que a resposta está na intenção de Eduardo Coutinho e na sua proposta de registrar e constatar a “qualidade” da nossa TV. A forma com a qual Coutinho seleciona e monta o que retratar(pois é obvio que houve uma edição de  material para caber na 1h e35mn de filme) expõe um alegorismo e voyeurismo nosso de cada dia.

 Mas as imagens ali presentes pareciam ter uma razão obvia de estar ali. Coutinho parecia querer nos dizer algo a selecionar programas de gosto duvidoso e muitos com a tarja de “sensacionalista” como “Balanço Geral” , “Brasil Urgente” e “Márcia” e momentos non-sense como Ana Maria Braga tocando Guitar Hero. O diretor ao selecionar esses momentos parecia querer provocar questionamentos de quem por ventura fosse assistir esse material. Questionamentos da percepção da qualidade do que assistimos diariamente. Ao mesmo tempo que gostaria de provocar uma reação no telespectador médio, Coutinho também se vê anestesiado e provocado pelo material que assiste. Posso imaginar Coutinho , um homem de tanta cultura abismado ao presenciar a alegoria vergonhosa que assola a nossa TV aberta(com raras exceções).

É difícil saber o que o diretor pretendia ao elaborar esta experiência fílmica de gosto duvidoso (pelo seu conteúdo puramente asfixiante na maioria do tempo e não pela proposta enriquecedora de Coutinho em compreender este meio de comunicação universal que é a televisão. Há um despudor na seleção do material seja pelas pegajosas e insistentes ações de merchandising que toma conta da nossa TV, pelos programas sensacionalistas e policiais ou por aqueles de cunho religioso que se proliferou como água nos últimos anos e que tenta a todo o custo “doutrinar” o telespectador.

O fato de Eduardo Coutinho um documentarista que há meu ver, flertou com outras mídias em seus trabalhos(“Jogo de Cena” utiliza a dramatização teatral e “Edifício Master” se aproxima da estética confessional dos Realitys Shows). Nota-se uma necessidade do cineasta em compreender esse mecanismo poderoso que é a televisão ao mesmo tempo em que fica estapafúrdio na sua constatação do material exibido.
O telespectador embarca em uma “Bad Trip” televisionada que pode ser comparada a sensação de prisão que temos ao ler 1984 de George Orwell pela constatação de somos reféns de um “sistema”. Sistema enganador, cultural, non-sense ou burro como a banda Titãs canta na música “Televisão” do álbum homônimo.


“Um Dia Na Vida” foi fruto de uma pesquisa de Eduardo Coutinho fez para um documentário nunca realizado, acredito que o diretor percebeu o potencial que tinha nas mãos ao conferir o material e assim viu a possibilidade de estreitar relações e dialogar com o panorama da TV atual. Uma experiência fílmica riquíssima, é difícil apontar qual a real intenção de Eduardo Coutinho ao realizar esse filme e infelizmente nunca vamos saber ao certo, por razão de seu recente falecimento(motivo dessa crítica homenagem) mas, acredito que o cineasta gostaria de provocar uma reação em torno do que consumimos artisticamente.  




sábado, 1 de fevereiro de 2014

Eu Te Amo Renato



As canções de Renato Russo, além de tratarem de temática sociais e políticas , inadequações eram em sua grande parte canções de amor e esperança. Por isso, o fato de existir um filme no qual um romance é permeado pelas canções do cantor é uma alegria e um deleite para um legionário como eu. Somado ao fato que “Eu te amo Renato” é um filme extremamente bonito e singelo que trata de questões universais com delicadeza é realmente um presente para o telespectador.

Dirigido por Fabiano Cafure e produzido exclusivamente para a internet em um esquema de criação coletiva “Eu Te amo Renato” conta a historia do despertar de três jovens, Beto(FelippeBondarovsky ), Adriana(Ingrid Conte) e André(Vinicius Moulin Allemand) a medida que a amizade entre os três evolui.

 Com as canções de Renato Russo servindo de pano de fundo para o enredo, Cafure costura não só a narrativa mas também os planos de acordo com a trilha sonora, de forma que a música conduz o espectador para dentro do universo fílmico do longa.
Como o longa foi feito para a internet, teve que haver uma adaptação a plataforma. Com isso, o diretor investe em planos mais fechados e em planos de conjunto o que lhe possibilita trabalhar a interação entre os três protagonistas, imprimindo uma direção coreografada as cenas. Ao mesmo tempo, o fato de ser um filme para a internet lhe permitiu uma liberdade para ousar na abordagem e na construção das cenas. É um filme ousado sim, mas tudo é feito com sensibilidade e de forma gradual.

O roteiro escrito a quatro mãos pelo diretor Fabiano Cafure e Diana Hime constrói de maneira singela e gradativa a relação entre os personagens. A delicadeza e o cuidado que os roteiristas tem em abordar essa relação com naturalidade , somado a forma competente do trabalho de Cafure e ao talento e entrosamento que o trio protagonista apresenta contribui para a beleza singular retratada no longa, esbanjando delicadeza e quebrando tabus ainda tão presentes em nossa sociedade de forma poética. Além disso, a dupla merece parabéns pela forma que desenvolve o roteiro. Pois o que começa como um filme trivial com uma bela trilha sonora se transforma em uma linda, delicada e emocionante história tendo como alicerce as canções de Renato Russo.

A trilha espetacular com canções de Renato Russo e outros garante um vigor ao longa. Mas são as canções de Renato Russo que são onipresentes e ajudam a construir a atmosfera libertaria que o filme carrega. A poesia das músicas enaltece as descobertas feitas pelos protagonistas e sobre o respeito as diferenças. Canções como “Tempo Perdido” , “Daniel na Cova dos Leões” e “Eu Sei” dão o tom poético necessário a uma fase de descobertas.


“Eu Te Amo Renato” é uma grande homenagem a pessoa e ao artista Renato e um filme que discursa sobre a liberdade e as diferenças de forma poética capaz de tocar qualquer coração mais sensível sendo um legionário ou não.




 Você pode assistir o filme nesse link: http://vimeo.com/63818812