sexta-feira, 18 de abril de 2014

Embriagado de Amor



Demorei a gostar de “Embriagado de Amor”, essa comédia esquizofrênica de Paul Thomas Anderson,um dos meus cineastas favoritos. Mas bastou uma segunda visita a essa comédia esquisita, para perceber o quanto eu me identifico com esse filme.

Barry Egran(Adam Sandler) é um cara esquisito, cheio de manias. Berry possui uma incapacidade social,é estranho e mimado por suas sete irmãs mais velhas, porém todo esse mimo também o sufoca socialmente.

“Embriagado de Amor” é a primeira vista um filme estranho, esquisito com uma atmosfera muito “fria” e impessoal mas, toda essa estranheza é um reflexo da personalidade do protagonista Barry(Adam Sandler, em uma atuação estranhamente cômica).

Paul Thomas Anderson reflete a esquisitice do personagem com enquadramentos muito duros, closes dotados de um jogo de câmera com o propósito de causar um desconforto cômico como os embates de Berry com suas irmãs superprotetoras. Anderson foi inteligente ao deixar fluir todo o talento cômico de Sandler. O diretor fica ali a espreita captando todo o humor do personagem.

 Em uma cena em particular, o cineasta utiliza de seu talento e destreza ao utilizar enquadramentos duros e repetitivos em diferentes posições ,focalizando o rosto de Sandler e captando assim, o sufoca mento e a inadequação social e afetiva do personagem.

Paul Thomas Anderson é mesmo um diretor e roteirista muito talentoso e com tamanha inteligência. Só com tamanho talento pra criar momentos cômicos non-sense sem cair no ridículo. Pelo contrario, Anderson cria e estrutura as situações de uma forma naturalmente cômica com exatidão e Adam Sandler numa excelente dobradinha ator-diretor realiza as cenas com uma naturalidade impressionante e principalmente sem cair no ridículo.

O diretor consegue estruturar seu filme com uma narrativa solida, fazendo de seu filme, uma comédia com conteúdo. Com cenas ora ágeis, ora longas, com direito a momentos de Barry em completo ócio  e cortes secos, seguidos por travellings.  A Relação de Berry com Lena(Emily Watson) é construída   com um tom cômico naturalmente embutido.


Eu não sou muito fã de comédias, mas “Embriagado de Amor” me ganhou não só pela inevitável identificação com as esquisitices do personagem de Sandler mas sobretudo pelo afeto com que Paul Thomas Anderson construiu sua historia com inteligência, ressaltando o componente emocional da narrativa e do personagem principal. “Embriagado de Amor” sem dúvida, está longe de ser um filme vazio e caricato , pelo contrário, é um filme com alma.

Anderson construiu sua narrativa sob o personagem de Adam Sandler. O diretor/ roteirista não teve receio de construir as situações, pois certamente , tinha plena certeza de duas coisas: Do talento de Adam Sandler e que todas as situações não eram estapafúrdias, existia sim, uma veia cômica com alguns tons acima em muitas delas porém, tudo isso é justificável se analisarmos a incapacidade social e carência afetiva de Barry(Sandler).

A relação de Barry com Lena(Emily Watson) é construída gradativamente, com cuidado,sensibilidade e principalmente, humor. Importante ressaltar não só a liga entre os personagens Berry-Lena pois ambos se encaixam por serem “fora do padrão” comportamental aceito na sociedade. Talvez, por isso mesmo, Paul Thomas Anderson tenha escolhido uma atriz que foge do padrão estético comum. Emily Watson , é bonita sim , mas está longe de ser uma Julia Roberts por exemplo.
É melhor que a atriz seja assim, se fosse muito bonita, perderia a graça e ficaria inverossímil.


O único ponto fraco foi a inclusão do sub-plot “da máfia do tele-sexo”. isso sim, foi muito manjado e descartável. Mas , tem uma boa justificativa; Tenho certeza que Anderson criou esse plot com o único propósito de ter o seu ator-fetiche , o saudoso Philip Seymour Hoffman abrilhantando seu longa.



Um dos aspectos mais interessantes e que também contribuem para essa estranheza inicial com o longa é a sua fotografia. A cargo de Robert Elswit. Construída predominante com cores frias e uma contraluz natural com luz solar rebatida e também estourada que realça e se justapõe a interpretação dos atores na cena , garantindo algum equilíbrio ao tentar quebrar aquela frieza do protagonista, ao mesmo tempo, essa alta luminosidade nas raras cenas externas no inicio do longa , representa o isolamento social de Berry(Adam Sandler). Interessante notar, que esse artifício é quebrado com a chegada de Lena(Emily Watson).


A trilha dietética de Jon Brion é espetacular, trabalhando em duas vertentes opostas que se completam na narrativa: Primeiro, um instrumental (não é a toa, que Barry “toma” um piano pra si) que reflete o isolamento social e o comportamento pelicular de Barry(Adam Sandler) e o uso de tambores africanos , que representam a trajetória de libertação social do personagem através do amor de Lena(Emily Watson). É como se o amor fosse tratado não só como uma libertação mas como uma razão para celebração.



Adam Sandler impressiona ao compor Barry com vários tiques e esquisitices próprias do personagem e com uma comédia presente a todo o momento, mesmo que nas entrelinhas. Sandler soube pontuar sua veia cômica para que ela surgisse natural e espontaneamente. O ator soube dar alma ao personagem e aos seus dilemas com  carisma e afeto, tornando fácil a identificação com o protagonista.


Emily Watson faz de Lena a perfeita metade da laranja de Barry. A atriz constrói sua personagem fora do padrão com leveza e encantamento ,além de estabelecer. química cênica com Adam Sandler. Não conhecia o trabalho de Watson, mas a atriz me lembrou Renée Zellweger em “Jerry Maguire

Philip Seymour Hoffman dispensa apresentações,até porque nem todos os adjetivos do mundo juntos seriam suficientes para descrever o seu talento. Digo apenas que sua atuação neste filme é a prova que um  grande ator brilha em qualquer papel. Não é difícil saber porque era o ator -fetiche de Paul Thomas Anderson, pena que já não está mais entre nós.



Paul Thomas Anderson fez em “Embriagado de Amor” uma comédia deliciosa para nós os desajustados, engraçada mas principalmente com alma e coragem.











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domingo, 13 de abril de 2014

Hoje Eu Quero Voltar Sozinho


O Curta-Metragem “ Eu Não Quero Voltar Sozinho” conquistou tantos fãs pela sua delicadeza, ternura e sensibilidade e tamanho o potencial da história , que o caminho natural é que o inspirador Curta se torna-se um Longa-Metragem.


E foi o que aconteceu, “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” não é uma continuação do curta, pelo contrário ,ele expande a narrativa recontando-a e tornando a trajetória do adolescente Léo(Guilherme Lobo) em busca de suas descobertas e independência enquanto tenta lidar com suas limitações por ser um deficiente visual muito mais prazerosa e inspiradora de se assistir.


O diretor Daniel Ribeiro soube fazer a transposição e a conversão da história de seu Curta-Metragem de maneira muito bem sucedida, evitando assim que o filme perdesse a qualidade da trama original e principalmente, a sua essência.

Dotado de uma incrível sensibilidade, Ribeiro conduz seu filme com a delicadeza esperada(e necessária). A forma com que as situações se formam na tela é tão natural e genuína que é impossível o espectador não deixar emocionar pela historia.

Como já disse, o diretor aposta na naturalidade e isso engloba tudo mas principalmente na sua forma de dirigir que aposta em uma agilidade de planos muito natural, de forma que as situações são construídas como uma crônica trivial, a sucessão de planos ocorre sem grandes efeitos sonoros,ela simplesmente ocorre , é natural como a vida.

Acho que isso diz muito sobre o trabalho de Daniel Ribeiro, o diretor aborda as questões de forma muito sensível e deixa que as tramas brotem de forma natural.

Natural também é a atmosfera fílmica que o diretor envolve o seu elenco,extraindo assim ótimas interpretações de seus atores, Ribeiro sabendo da preciosidade nas atuações de seu elenco concentra sua câmera em duas posições principais: A espreita quase imperceptível, apenas acompanhando o desenrolar da narrativa e apostando fortemente nos closes e plano-contraplano, o que permite ao diretor extrair a ternura que permeia a narrativa e Ribeiro é extremamente habilidoso na direção de atores captando as feições e nuances genuínas do seu talentoso elenco.

A fotografia é um dos pontos altos do filme, pela forma que engrandece as imagens e eterniza as cenas , conferindo-as uma beleza muito sutil. Apostando em uma luz difusa dosada a uma contraluz , o diretor de fotografia  Pierre de Kerchove encontra o equilíbrio perfeito para eternizar as cenas na memória e no coração de quem assiste.  

Como uma trilha magistral que fica na ponta da língua , a ponto de sair da sala de cinema cantarolando é um elemento narrativo de grande poder pois emana sentimentalismo ao longa.

O Roteiro de Daniel Ribeiro tem muitos atributos, pra começar, o diretor-roteirista constrói uma história totalmente encantadora e inspiradora, segundo, a forma genial com o que o cineasta aborda as temáticas das diferenças, sexualidade , independência e bullying são muito criveis , contribuindo para desmistificar os tabus que infelizmente ainda existem em nossa sociedade e acabar com o preconceito. O fato de Ribeiro não fazer da deficiência de Léo(Guilherme Lobo) o plot principal da narrativa é uma grande evolução, pois mostra que as diferenças são sim uma característica da nossa personalidade mas de forma alguma define quem as pessoas são.

O único porém na transição do curta para o Longa-Metragem foi que a narrativa perdeu um pouco do seu dinamismo que existia no curta, mas nada que prejudique o potencial do filme, pelo contrario é um mero detalhe.


Guilherme Lobo , Fábio Audi e Tess Amorim dão conta da difícil tarefa de “comandar” a narrativa, já que a trama do filme paira sobre os seus personagens, embora no longa, esse triangulo amoroso se torne um quadrilátero com a entrada de Karina(Isabela Guasco).

Guilherme Lobo merece honrarias pela forma com que reconstrói o seu personagem, Léo dando novas nuances aos novos e antigos dilemas que o adolescente enfrenta.

Lobo, Fábio Audi(Gabriel) e Tess Amorim(Giovana) não apenas reconstroem os seus personagens de forma impar, dando vivacidade e esbanjando química cênica mas exaltam sentimentalismo em seu estado puro emocionando o espectador e fazendo do corriqueiro um grande acontecimento.

Dois atores também merecem menções especiais: a Presença luminosa da excepcional atriz Selma Egrei como Maria, a avó do protagonista Léo(Guilherme Lobo) e Eucir de Souza como Carlos, o pai de Léo que incentiva a independência do filho. O ator tem uma performance maravilhosa, terna e graciosa. (emocionante a cena em que Carlos ensina Léo a se barbear, química perfeita).


Daniel Ribeiro conseguiu o seu objetivo. Emocionou, tocou corações ,provocou reflexões com um filme muito simples mas que se torna grandioso em sua simplicidade. Tocando, mágico e encantador “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” é maravilhoso e nada abalou seu potencial nem a quebra na dinâmica na transição curta-longa. Ouso dizer que a história de Léo e companhia tem potencial pra ainda mais de modo que torço pra uma continuação.


“Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” é a perfeita traide entre encanto,magia e sensibilidade e um forte candidato aos melhores filmes do ano.